O desenho é a representação sem máscara, o osso da imagem que um artista pode conceber. O desenho é a estrutura que tantas vezes a mancha vem debelar mas sem a qual tudo desmorona. Expôr o desenho é revelar, é assumir, como se regressássemos à base da expressão plástica e entendêssemos os seus fundamentos como bastantes.
A Galeria Solar Santo António apresenta uma colectiva de desenho tão diversa quanto diversos hão-de ser sempre os artistas, porque diversas hão-de ser sempre as pessoas e os seus pontos de vista ainda que reduzidos ao seu espaço mais elementar. Cada um de nós é o somatório caótico de escolas, intuições e percepções mais ou menos definidas que resultam claramente num enfoque específico da realidade, no sentido em que tudo é real, tudo acontece, até a fantasia. O desenho, pela sua natureza, há-de ser reflexo de tudo isto, fantasiando concreta ou abstractamente sobre cada tema, assacando ao que somos, e ao que somos capazes de fazer, um vislumbre, uma imagem partilhável que, infinitamente reinterpretada, possa comunicar, comunicar perenemente.
O desenho é o fio de Ariadne sem labirinto, ou tendo como labirinto o seu próprio corpo ou a sua própria liberdade, e que liberdade tão incrível há-de ser essa que se aprisiona, se manifesta a partir do intrincado do fio, do rumo contínuo ou acidentado do fio. O desenho é a linha de pesca e o próprio peixe, é o conjunto da sua forma e do que representa, e mais daquilo que podemos acrescentar pela nossa peculiar visão das coisas, aquela fantasia de que também se faz a realidade. O desenho é a linha de pesca, é o peixe e o movimento. Junta o fio e o labirinto e pode ser o minotauro com maior ou menor consciência disso.
Apostar no desenho é como compreender claramente a importância de um regresso às origens, para compreensão da fundação das coisas e como, reduzidas às estruturas, as obras podem estar já tão completas. Regressar ao desenho é destemer, depurar, abdicar. O desenho tende a ser um universo de humildade material e de um esplendor formal.
Esta Pesca à linha é a procura incessante das estruturas das imagens, um andar à cata das formas e dos conteúdos como quem conquista objectos, como quem os seduz para um discurso que se faz para sempre, um discurso que opera para sempre, como é o grande trunfo da arte.